Imagens obtidas pelo G1 mostram recém-nascidos no Hospital Regional de Ceilândia, no Distrito Federal, usando incubadoras quebradas e dividindo o mesmo equipamento com outros bebês. As imagens revelam ainda que gestantes aguardam o trabalho de parto em cadeiras de madeira fora do centro obstétrico e, após dar à luz, ficam em cadeira de rodas para amamentar os filhos, e não em leitos destinados ao repouso.
Ao G1, a Secretaria de Saúde informou desconhecer casos de bebês dividindo a mesma incubadora. Segundo a pasta, o reparo dos equipamentos quebrados estava suspenso por falta de pagamento do contrato de manutenção. “O atendimento, neste momento, está sendo normalizado”, disse a secretaria, por e-mail.
Uma funcionária que não quis se identificar comentou a situação. “Está um caos. Pacientes em cadeiras de rodas por falta de leitos para acomodar mães e filhos. Mães tendo que dividir box por conta da superlotação do setor, gestantes em trabalho de parto aguardando para entrar no centro obstétrico sentadas no banco devido à superlotação, recém-nascidos dividindo berços com outros recém-nascidos."
A secretaria disse ainda que o Hospital Regional de Ceilândia faz cerca de 600 partos por mês “Quantitativo alto e que compreende os atendimentos das gestantes de Águas Lindas de Goiás e de Brazlândia, que geram uma sobrecarga na regional”, explica.
A pasta informou estudar formas de reforçar o quadro de servidores por meio da convocação dos aprovados no concurso de 2014 ou renovação de contratos temporários. Sobre a falta de medicamentos e materiais, a secretaria diz que o reabastecimento das unidades de saúde “está sendo normalizado gradativamente”, mas nega que haja desabastecimento no Hospital de Ceilândia.
“Nenhum atendimento deixou de ser realizado na última semana em função de falta de medicamentos”, disse a secretaria, por e-mail. A pasta completou que o hospital “está com uma demanda maior do que o comum e está trabalhando para atender com mais qualidade os pacientes”.
Gravação
As imagens foram feitas no último dia 29. Um vídeo mostra incubadoras cheias de poeira em uma sala do hospital. A gravação, de 37 segundos e feita por funcionários, revela três equipamentos sem funcionar, mas, segundo os servidores, há mais outros quebrados. As imagens revelam ainda um berço com aquecedor quebrado e com o ar-condicionado funcionando em cima do recém-nascido.
Está um caos. Pacientes em cadeiras de rodas por falta de leitos para acomodar mães e filhos. Mães tendo que dividir box por conta da superlotação do setor, gestantes em trabalho de parto aguardando para entrar no centro obstétrico sentadas no banco devido à superlotação, recém-nascidos dividindo berços com outros recém-nascidos.”
“Falta segurança para a equipe trabalhar, não temos como permanecer nessas condições. É um descaso. Temos medo dos riscos que corremos e, principalmente, os riscos das mães e recém-nascidos”, disse uma funcionária.
De acordo com servidores da Regional de Saúde, o hospital não tem a estrutura necessária para atender a média 600 partos por mês. “Faltam medicamentos, dipirona, fios para sutura, esparadrapo e materiais para os procedimentos”, disse.
Apesar da precariedade, a paciente Ingrid Karoline diz que a alegria de ter um filho faz com que as mães relevem a situação do hospital. “Nada vai abalar a vontade e alegria de ser mãe, nem mesmo a falta de estrutura para receber uma gestante nesse hospital. Fiquei esperando mais de cinco horas, com três centímetros de dilatação sentada em uma cadeira fora do centro obstétrico”, disse.
Maurício Serafim, marido de uma gestante prestes a dar à luz, teve que voltar com a mulher com dois centímetros de dilatação para casa. Ele afirmou que o Hospital Regional de Ceilândia não tinha vaga para recebê-la.
“Fui ao hospital com a Luciana [mulher dele] segunda-feira, estava com contração e dois centímetros de dilatação. Chegando lá, mandaram a gente voltar para casa, alegaram que o hospital, no momento, não tinha vaga para recebê-la, e que havia prioridades, como outras gestantes com dilatação maior aguardando na fila. Às 3h do dia seguinte, a bolsa estourou e tivemos que correr para o hospital novamente”, disse Maurício.
Após o parto, surgiu um novo problema. “Minha mulher teve filho às 4h de terça-feira mesmo, mas do mesmo jeito que não tinha vaga no centro obstétrico, agora não tem vaga na maternidade para ela sair. Não consigo falar com a minha mulher, não vi ainda meu filho e nem sei quando ela vai ter alta. Precisamos de respeito e dignidade. Pagamos nossos impostos. É muito pedir a maternidade para que ela saia do centro obstétrico?”, questionou.
A médica Rosa Elisa, da Associação Médica de Brasília, questiona os cuidados às gestantes, mães e recém-nascidos mostrados nas fotos e vídeo. “As mães têm direito de ter uma cama, maca, não tem como ficar em uma cadeira de rodas. Elas ganham neném e ficam fragilizadas, por vários fatores, e necessitam de repouso.”
Rosa disse ainda que gestantes não devem aguardar a hora do parto sentadas. “Está errado. A mãe deve ficar deitada, porque, se ficar sentada, ela pode ter uma contração e o neném pode vir a sair e cair no chão. É uma falta de respeito muito grande."
Ela também afirmou que recém-nascidos não devem dividir o mesmo espaço. “Não é ideal em hipótese alguma recém-nascidos dividirem o mesmo berço, tanto por causa de bactérias, como de doenças. Toda mãe tem suas bactérias, e o neném pode pegar a bactéria, principalmente se for parto normal, e aí uma criança pode passar para outra”, declarou a médica.