A mosca-dos-estábulos (Stomoxys calcitrans) é comum em todo o país e se alimenta de sangue de vários animais, principalmente equinos e bovinos, além de animais silvestres e, eventualmente, o homem. Embora parasite outros animais de criação, os bovinos são os mais afetados, com perdas de 10% a 30% no ganho de peso e até 50% de redução na produção leiteira. Estima-se que os prejuízos causados por esta mosca no Brasil podem atingir 350 milhões de dólares anualmente.
Embora as infestações sejam mais comuns em gado de leite, devido ao desenvolvimento das larvas da mosca em resíduos de alimentos e dejetos animais acumulados nas propriedades, explosões populacionais (surtos) da mosca-dos-estábulos têm sido cada vez mais frequentes também em gado de corte.
Na última década, surtos da mosca-dos-estábulos têm causado sérios prejuízos a pecuaristas nas proximidades de usinas sucroalcooleiras em pelo menos cinco estados brasileiros. Nos últimos três anos, mais de 15 surtos foram registrados em sete municípios de Mato Grosso do Sul, além de surtos registrados também em São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás.
As usinas são frequentemente apontadas pelos produtores afetados como a causa dos surtos, razão pela qual também se juntaram aos pecuaristas no combate a essa praga. Além dos prejuízos econômicos, a ocorrência de surtos frequentemente leva um grave conflito entre os setores envolvidos. Entretanto, apesar dos anseios da sociedade, não existe solução para o problema no curto prazo. Embora comprovada a relação entre fazendas de gado e usinas alcooleiras na dinâmica dos surtos, vários aspectos importantes sobre sua epidemiologia são ainda pouco conhecidos e precisam ser investigados. Nesse sentido, a Embrapa tem desenvolvido pesquisas com o objetivo de desenvolver tecnologias que permitam prevenir ou reduzir significativamente o problema.
No Brasil, a produção de cana-de-açúcar está em expansão acelerada em função do grande incentivo à produção de álcool combustível. O número de usinas e áreas de cultivo canavieiro crescem sistematicamente, implicando em maior quantidade de subprodutos orgânicos gerados. Desde 2008, a ocorrência de surtos tem sido registrada com frequência, particularmente pela mídia.
Pesquisas mais recentes mostram que a torta de filtro (resíduo sólido da filtragem do caldo da cana-de-açúcar) e a palha da cana misturada com a vinhaça ou vinhoto (resíduo da destilação do caldo fermentado durante a produção de álcool) são os principais locais de desenvolvimento e multiplicação de moscas nas usinas de cana-de-açúcar.
É importante ressaltar que surtos da mosca-dos-estábulos também podem ocorrer sem a participação das usinas canavieiras. Resíduos de suplementação alimentar (ração, silagem, feno, etc.), misturados com dejetos animais, são excelentes ambientes de desenvolvimento da mosca nas propriedades pecuárias, proporcinando a reinfestação dos rebanhos e servindo de fonte de dispersão das moscas para multiplicação nas usinas. Além disso, nos últimos anos, vários surtos têm sido decorrentes do uso inadequado de adubos orgânicos, como a cama-de-frango e efluentes de suinocultura, agravando ainda mais a situação.
Assim, estratégias de controle e prevenção devem ser direcionadas para a eliminação dos locais de criação da mosca, devendo ser incorporadas na rotina das fazendas e usinas. O manejo sanitário nas propriedades pecuárias é fundamental ao controle da mosca. Ou seja, para o pecuarista, a recomendação principal é a remoção e o adequado destino dos resíduos alimentares e dejetos animais espalhados ao redor dos cochos, leiterias, etc. Uma sugestão é a compostagem dos resíduos, com posterior utilização como adubo. Ações complementares incluem também o controle de vazamentos e drenagem do terreno para evitar empoçamentos, particularmente próximos a cochos. Estas medidas são de baixo custo e contribuirão significativamente na redução da população da mosca-dos-estábulos.
Por outro lado, em função do grande volume de substratos orgânicos e extensas áreas favoráveis ao desenvolvimento das larvas, o controle da mosca nas usinas demanda ações de manejo cultural específicas para reduzir a população de moscas, nas áreas de plantio de cana-de-açúcar. Algumas das principais medidas a serem adotadas nos canaviais incluem a redução do volume de vinhaça por hectare, recolhimento da palha antes da aplicação de vinhaça, enterrio da palha (sub-solagem) após a fertirrigação e enleiramento com posterior revolvimento da palha. De modo geral, estas medidas visam aumentar a absorção da vinhaça e das águas de chuva pelo solo e diminuir umidade, e consequentemente, a favorabilidade dos ambientes ao desenvolvimento das larvas.
A aplicação de produtos inseticidas comerciais apresenta resultados variáveis no curto prazo, sendo economicamente inviável em médio e longo prazos. Não existem informações seguras sobre como, quando e onde aplicar os inseticidas, principalmente em larga escala, o que compromete sua eficácia. O uso de inseticidas no controle das moscas-dos-estábulos sobre os animais tem se mostrado pouco eficiente nas formulações atualmente disponíveis, tornando imprescindíveis as ações preventivas nos criadouros.
Em outra linha de ação para a prevenção de surtos está o uso da queima profilática da palha residual pós-colheita. A Embrapa Gado de Corte publicou um comunicado técnico sobre sua utilização como alternativa para controle de mosca-dos-estábulos em situações críticas. Ainda assim, para o uso do fogo como método de controle são necessárias autorizações nos órgão competentes, uma vez que as queimadas são regulamentadas por leis específicas.
Cabe ressaltar que para um combate eficiente da mosca, fazendas e usinas deverão trabalhar em conjunto. Mesmo em locais onde as usinas adotaram medidas preventivas, não houve redução do problema sem a efetiva participação dos pecuaristas e vice-versa. Mais informações sobre surtos e medidas de controle podem ser encontradas no Documento 175 e no Comunicado Técnico 126, da Embrapa Gado de Corte. Ambos estão disponíveis no site institucional (http://www.cnpgc.embrapa.br/) na área de publicações.