TV deverá ser apenas digital até o fim de 2018

Um dos meios de comunicação mais populares do país está passando por uma revolução tecnológica. Até o fim de 2018, o sinal analógico da TV aberta será desligado nas capitais e principais cidades do interior do país. Com isso, a maior parte dos brasileiros vai entrar numa nova era da televisão, a digital, com qualidade superior de imagem e de som, e recursos como a multiprogramação.

O processo de transição está sendo feito em etapas e registra atrasos. Sucessivas portarias do Ministério das Comunicações (que acaba de ser fundido com o Ministério da Ciência e Tecnologia) foram publicadas para redefinir os calendários de desligamento — tecnicamente chamado de switch off. Por enquanto, a única cidade brasileira que assiste somente à TV digital é Rio Verde, no interior de Goiás.

Conforme o cronograma em vigor, Distrito Federal e Entorno terão transmissões analógicas interrompidas em outubro deste ano. Ao longo de 2017, será a vez das quatro capitais da Região Sudeste; de Salvador, Recife e Fortaleza, no Nordeste; e de Goiânia, no Centro-Oeste (veja quadro). Outra portaria ministerial definirá as localidades para 2018. Com isso, o governo espera que cerca de 1,4 mil cidades tenham o processo de migração concluído.

O diretor-geral da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Luis Roberto Antonik, lembrou que a intenção inicial de implantar o novo sistema digital em todo o país foi abandonada e agora se optou por desligar o sistema analógico somente nas cidades onde seria necessário abrir caminho para a tecnologia 4G. É que com a migração do sistema, a faixa de frequência de 700 MHz ficará livre para ser usada pelas operadoras na implantação da telefonia de quarta geração.

Antonik disse que a instalação da TV digital no Distrito Federal e Entorno será o primeiro grande desafio e lamentou a falta de campanha mais intensa de esclarecimento para a população:

— Brasília será um teste, pois abrange região onde estão 4 milhões de habitantes e 1,2 milhão de domicílios, com desligamento previsto para 26 de outubro. Nossa principal preocupação é com a divulgação. É preciso chegar a 93% para que o sistema analógico seja abolido.

Segundo ele, a Abert defende que a migração seja feita o quanto antes, não só porque a TV digital é melhor para os telespectadores, mas pelo fato de as emissoras terem que bancar custos de dois sistemas enquanto a transição não é totalmente concluída.

Sem pressa

O conselheiro da Anatel Rodrigo Zerbone é o presidente do Grupo de Implantação do Processo de Redistribuição e Digitalização de Canais de TV e RTV (Gired), responsável por disciplinar e fiscalizar a migração do sistema e do qual fazem parte governo, empresas e entidades representantes dos radiodifusores. Ele assegura que o calendário escalonado de desligamento do sinal analógico foi a melhor opção para garantir o êxito do processo.

— Temos nível de segurança alto de que o atual cronograma, contemplando capitais e grandes cidades do interior até 2018, não será mais alterado. Nossa preocupação é não deixar ninguém sem acesso à TV. Não faria sentido acelerarmos o processo, excluindo parte da população. Estamos avançando com o pé no chão, de modo que a maioria dos brasileiros vai estar incluída no desligamento até 2018 — explica.

Zerbone destacou que parte da estrutura de radiodifusão do país, apesar de suas dimensões continentais, está a cargo de prefeituras e associações sem recursos para investir e sem mão de obra qualificada. A crise econômica também atrapalhou o processo:.

— Os Estados Unidos fizeram o desligamento em 2009 nos grandes centros, mas até hoje não desligaram totalmente o sinal analógico das transmissões locais, com cobertura menor. Isso dá ideia da dificuldade. Por isso, o interior do Brasil vai demandar mais tempo — afirmou.
Conversor

Quanto a Brasília, o presidente do Gired chama a atenção para dois fatores: a região já tem muitas emissoras transmitindo digitalmente e a população tem facilidade de acesso a novos aparelhos de TV, o que já garante de início um índice de digitalização acima de 70%. No último fim de semana, alunos de cursos técnicos do Senai percorreram as ruas de Ceilândia e Taguatinga, duas entre as maiores regiões administrativas do DF, para ajudar a população a instalar o conversor, imprescindível para quem tem aparelhos de TV mais antigos.

— Este mês vamos entrar numa fase de maior divulgação e a campanha vai ganhar corpo. A população tem que saber do que se trata. Saber, por exemplo, que a TV aberta digital em termos de qualidade de imagem supera até a TV por assinatura — disse ele.
Aparelhos antigos precisarão de conversor e antena externa

Para o fim do sinal analógico, será necessária a participação ativa da população. Os donos de aparelhos antigos precisarão trocá-los por novos ou adquirir um conversor de TV digital, que custa a partir de R$ 110 nas lojas de eletroeletrônicos ou em sites da internet. Pode ser necessária também uma antena externa apropriada.

Quase todos os modelos de TV fabricados após 2010 — os de tela fina, tipo plasma, LCD ou LED — já possuem conversor de TV digital integrado. Portanto, a vida de quem tem um desses em casa ficará mais fácil. Talvez seja preciso trocar somente a antena, que tem de ser adequada para a recepção nesse formato.

Em geral, os televisores trazem o selo "DTV", indicando que estão prontos para a nova tecnologia.

— Há o risco de interferência do celular no televisor, pois as frequências são muito próximas. A antena externa mitiga esse problema. Acabou a época da palha de aço nas antenas e dos chiados. Ou a TV digital funciona perfeitamente, ou não vai funcionar — explica o diretor-geral da Abert, Luis Roberto Antonik.

Sobre isso, o presidente do Gired, Rodrigo Zerbone, tranquiliza a população. Segundo ele, foram feitos testes e não é questão tão grave.

— É claro que é algo que merece atenção, mas temos capacidade de ação grande, se necessário. Uma das preocupações do governo e das emissoras é garantir que todos os cidadãos, especialmente os de baixa renda, tenham acesso ao serviço.

As famílias inscritas no Cadastro Único do governo federal, integrantes de programas sociais como Bolsa Família, Luz Para Todos e outros, serão beneficiadas com um kit contendo uma antena, um conversor, cabo e conectores, o que as dispensará de comprar um aparelho novo de TV. Para retirar o kit, o interessado deve agendar pelo telefone 147 com o Número de Identificação Social (NIS), localizado no cartão PIS-Pasep, na Carteira de Trabalho, no extrato do FGTS ou no Cartão Cidadão.
Dúvidas

Moradores de qualquer região do país podem tirar dúvidas por meio de uma central de atendimento e saber, por exemplo, quando sua cidade vai receber o novo sistema e quem tem direito aos kits. O número é 147.

Também é possível obter informações sobre o assunto por meio do site www.vocenatvdigital. com.br, mantido pela Empresa Administradora da Digitalização (EAD), que foi criada pelas operadoras de telefonia vencedoras do leilão da faixa de frequência de 700 MHz (Vivo, TIM, Claro e Algar) para atuar no processo de transição do sistema. É da EAD a responsabilidade de distribuir os kits aos beneficiários dos programas sociais do governo.

Congresso tem de acompanhar novo sistema, defende senador O processo de implantação da TV digital no Brasil deve ser acompanhado com atenção pelo Congresso, na opinião de Walter Pinheiro (sem partido- BA). Especialista no assunto, o parlamentar lembra que é obrigação do Legislativo cobrar do governo promessas feitas anteriormente à população e que podem agora não ser cumpridas, como a universalidade e a mobilidade do sistema.

— Lamentavelmente essa discussão não mobiliza e já fiquei aqui pregando no deserto, sozinho. Mas é preciso entender que isso não é debate somente técnico, é de serviço. O Parlamento tem obrigação de se meter, sim, para defender o consumidor e o mercado brasileiro, pois pode haver aí modelo de negócio que gera oportunidade, emprego e renda — afirmou.
Testes

O senador adverte para o grande desafio que vai ser implantar o novo sistema em todo o país. Segundo ele, o teste em Rio Verde, interior de Goiás, não abrange todas as possíveis dificuldades a serem encontradas pelo caminho.

— O teste em Rio Verde, com todo respeito à cidade, não bastou e tinha que ter sido feito no coração dos problemas; num lugar, por exemplo, onde há muitas emissoras de TV, de rádio base, torres e emissoras de radiodifusão. Aí se teria ideia de cada cenário pelo Brasil afora. Isso não foi feito nessa escala. Os testes servem exatamente para se saber como agir para ofertar serviço de qualidade — opinou.

Para Pinheiro, o troca-troca de ministros na pasta das Comunicações nos últimos anos também atrapalhou o processo. Além disso, segundo ele, no último leilão da faixa de 700 mhz, o governo se preocupou muito mais em arrecadar do que adotar postura de limpeza e uso racional do espectro. Na avaliação dele, na era da radiodifusão e da telefonia móvel, o espectro de frequência é crucial, o "ouro da Babilônia"

— Não acho que é preciso pôr no ministério necessariamente ministro que entenda do assunto, mas pelo menos alguém que se cerque de quem entende. Não precisa entender de frequência, aliás, é algo que poucos dominam no Brasil. Basta ter cabeça para o futuro e a ideia de fazer algo para todos os brasileiros, e não para alguns — disse Pinheiro, que foi relator do PLC 21/2015, aprovado em julho do ano passado, dando incentivos às indústrias de equipamentos para TV digital e de componentes eletrônicos semicondutores.
Baixa cobertura

Qualidade, interatividade, cobertura e prestação de serviços preocupam o senador. Ele diz que, apesar de haver aparelhos televisores em quase 99% dos lares brasileiros, o percentual de cobertura de banda larga fixa no Brasil é de 26%, o que é muito pouco para um país continental que precisa ofertar serviços pela TV.

— Vamos chegar com imagem que dará para ver até mancha na camisa. Mas seria desperdício entrar com sinal digital e não extrair nada mais. Temos que aproveitar a tecnologia e levar muito mais para os lares do que imagem em full HD — opinou.