Com a alta dos juros e o menor apetite por crédito, os bancos adotaram uma estratégia arriscada e que deve comprometer ainda mais o orçamento das famílias: alongaram os prazos de financiamento, para que a parcela se encaixe no bolso do cliente.
 
O prazo médio dos financiamentos para pessoas físicas subiu de 47,9 meses em setembro para 52,2 meses em outubro. A tendência se manteve em novembro, e o período total para quitar o crédito chegou a 52,4 meses, segundo estudo da CNC (Confederação Nacional do Comércio), feito a pedido da Folha.
 
Em novembro de 2013, os consumidores tomavam empréstimos, em média, de 47,7 meses. Nos últimos 12 meses, o prazo sempre oscilou ao redor de 47 e 48 meses.
 
Um aumento de cerca de quatro meses "é muito expressivo", segundo Fábio Bentes, economista da CNC. "O brasileiro não está acostumado a olhar a taxa de juros. Vê apenas se a prestação se enquadra no orçamento."
 
Num primeiro momento, diz, a estratégia dos bancos pode dar algum fôlego ao consumo. No médio prazo, porém, compromete ainda mais a renda das famílias, que já sentem os efeitos da inflação mais alta e da desaceleração da renda (com reajustes salariais mais baixos e menor ritmo das contratações).
 
"Os clientes estão contraindo uma dívida mais cara e por um período mais longo. Isso vai rebater no consumo e no desempenho do comércio em 2015", afirma.
 
A CNC estima uma alta de 3,6% nas vendas do comércio, com "viés de baixa" diante da perspectiva de maior endividamento das famílias. Para 2014, a expectativa era de um crescimento de 3,2%.
 
JUROS
 
Luis Miguel Santacreu, economista da Austin Asis, consultoria voltada ao setor, também diz que o objetivo dos bancos foi permitir que as parcelas se adequassem ao orçamento das famílias numa fase de juros maiores.
 
Em média, a taxa para pessoas físicas passou de 42,8% ao ano em setembro para 44% em outubro. Bateu o recorde histórico em novembro: 44,2%. Era de 38,5% em novembro de 2013.
 
O economista diz, porém, que a estratégia dos bancos só foi possível graças à ação do governo. O Banco Central liberou mais recursos dos compulsórios (percentual dos depósitos bancários que ficam retidos na instituição) para estimular o crédito, especialmente o consignado, e evitar freada muito brusca do consumo no final de 2014.
 
Nem todos, porém, conseguem acessar o crédito bancário, que está cada vez mais seletivo para linhas de maior risco de calote, como veículos, cartão e cheque especial.
 
PROBLEMA
 
O aumento dos prazos, diz, pode se converter num problema para os bancos, pois há a possibilidade de aumento da inadimplência —atualmente, em patamares historicamente baixos, o que abriu caminho para ampliar o número de parcelas.
 
A Febraban (que representa os bancos) diz que os prazos só subiram porque o governo elevou de 5 para 6 anos o tempo de pagamento de empréstimos consignados para aposentados, e de 60 para 96 meses o prazo para servidores públicos federais.
 
A entidade diz ainda que os juros têm "subido muito mais nas linhas de cheque especial e crédito pessoal não consignado, linhas de maior risco". As taxas, diz, também avançaram em razão do aumento da taxa básica Selic.