Lara Campos ganhou uma bolsa de estudos para ter aulas de técnicas de aviação, aerodinâmica, navegação e meteorologia
Naquele dia, quando meu celular vibrou, levantei com preguiça do sofá para ver o que era. De repente, tomei um susto. Na mensagem, estava escrito: “Oi, Lara! Lembra do processo seletivo para a National Flight Academy? Você foi uma das nove aprovadas”. Esfreguei os olhos para ler de novo. Sim, era isso mesmo. Eu havia ganho uma bolsa de estudos para participar de um programa na Academia Nacional de Voo Americana! Isso significa que tinha sido aprovada para passar seis dias a bordo do maior simulador de porta-avião que existe no mundo, na sede da NASA, na Flórida (Estados Unidos). Durante essa imersão, eu poderia discutir carreiras ligadas à área científica com pessoas de várias partes do planeta. Meu Deus! Não sabia o que pensar. Era um misto de nervosismo e alegria.
Minha primeira reação? Fazer um tweet. A mensagem bombou tanto que chegou a 92 mil curtidas. Em seguida, tremendo de emoção e pulando de felicidade, liguei para a minha mãe. “Alô, mãe? Vou para a NASA! Eu passei!” Enquanto respondia a todas as perguntas dela, um filme passou pela minha cabeça. Lembrei de todos os degraus que tive que subir para conquistar essa oportunidade. Não, não foi fácil, mas também foi muito prazeroso perceber que todo esforço valeu a pena. Vou te contar como cheguei até aqui...
Meu nome é Lara Campos, tenho 16 anos, moro no bairro do Catete, no Rio de Janeiro, e sou estudante do Colégio Pedro II, uma escola federal que tem parceria com a ONG Junior Achievement. Tudo começou em maio de 2018, quando tive a chance de participar do programa Miniempresa, que a ONG realiza na minha escola.
Mão na massa
Por meio desse projeto, os alunos aprendem a criar uma empresa com o objetivo de fazer o protótipo de um produto. Tivemos que pensar em todas as demandas e funções, como se fosse de verdade. Eu exerci a função de diretora de marketing da Kicanga, que fabricaria uma canga com alça e um compartimento com zíper, permitindo que ela se tornasse uma bolsa ou mochila.
Para conseguir o dinheiro da produção, vendemos ações da empresa para nossos amigos e familiares. Apenas a parte de costura foi terceirizada. O produto foi um sucesso e nós ficamos em primeiro lugar.
Seis meses depois, eu e meus amigos tivemos a ideia de participar de outro programa aplicado pela mesma ONG, só que dessa vez em parceria com a Brazil Conference at Harvard & MIT. Nosso desafio foi buscar uma solução inovadora e tecnológica para democratizar a cultura dentro das favelas. Quebramos muito a cabeça até apresentarmos uma plataforma que realizava o encontro de pessoas que tinham lugares disponíveis para eventos e músicos. Queríamos justamente transformar em espaços de cultura os galpões que estão abandonados por aí. O objetivo era conseguir recursos por meio de crowdfunding, além de ter um local de vendas de produtos, como camisetas, em cada um desses lugares.
Ganhamos de novo! Isso nos abriu as portas para participar do Desafio TACK Rio, evento que reuniu, em novembro passado, outras dez escolas cariocas e aconteceu no Parque Laje. Fomos finalistas e acabamos em segundo lugar.
Sucesso? Sim, aceito!
Todos os jovens que participam dos programas aplicados pela ONG Junior Achievement são convidados a integrar o NEXA (Núcleo de Ex-Achievers). É uma turma que quer continuar em contato com o empreendedorismo. E eu, claro, aceitei.
Em março deste ano, trabalhei como staff em um evento da NASA promovido pela ONG. Durante um fim de semana, tive a oportunidade de assistir a palestras com engenheiros e diretores norte-americanos e de Agências Espaciais pelo mundo – a brasileira, inclusive. Conheci alunos de muitas escolas e universidades, conferi uma exposição de objetos da NASA e um projeto de estudantes da Universidade Federal do Rio de Janeiro com foguetes. Foi incrível!
Eu já estava superextasiada com o evento quando o NEXA ofereceu um formulário para concorrer a uma bolsa de estudos e participar do programa da Academia Nacional de Voo. Claro que logo peguei um para me inscrever. Ele era enorme, todo em inglês, e tive que responder questões como “o que o programa poderia agregar à minha vida”. Fiz em casa, sozinha e não contei para ninguém. Até que, um mês depois... Corta para o início deste depoimento.
Do Rio para a Nasa
Lá, durante seis dias, vamos ter aulas de técnicas de aviação, aerodinâmica, navegação, meteorologia e comunicação de voo, além de noções de pilotagem em simuladores. Gente, não consigo imaginar como vai ser essa experiência! Vamos participar de discussões sobre carreira ligadas a ciência, tecnologia, engenharia e matemática – grupo identificado pela sigla STEM (science, technology, engineering, and mathematics).
Apesar de ter boa parte dos custos cobertos pela bolsa, como alimentação e hospedagem, as passagens aéreas devem ser pagas por nós, estudantes. E a gente soube do curso em abril. Os preços das passagens estavam elevados, justamente pela viagem ser em junho, alta temporada nos Estados Unidos.
Nove estudantes brasileiros foram selecionados. Coincidentemente, três das aprovadas são aqui do Rio, umas delas da mesma escola que eu. Nem preciso falar como ficamos felizes em saber que, muito em breve, seremos três garotas cariocas pilotando foguetes na NASA. É #girlpower que fala? Por isso, decidimos nos unir e fazer uma vaquinha on-line para arrecadar os R$ 21 mil que vão custar as passagens de ida e volta de todas nós. Por enquanto, conseguimos 30% do valor. Mas temos esperança...
Minha hora chegou
Meus pais jamais poderiam pagar por esse curso. Ganhar essa bolsa foi incrível e não vou desistir de viver essa experiência. Nunca saí do Brasil e essa oportunidade é única: uma chance de adquirir conhecimento e conhecer pessoas com as quais jamais imaginei cruzar na minha vida.
A ciência conquistou meu coração. Espero poder compartilhar esse sonho e abrir caminhos para outras meninas brasileiras. Com as outras duas estudantes, quero provar que nós, mulheres, podemos chegar aonde quisermos.
Enquanto isso, estou aprendendo a ver ciência em tudo o que faço no dia a dia. Ela está presente nas reações físicas ou químicas que sentimos e até na música, minha primeira e grande paixão. Ainda não tenho que escolher entre as duas profissões, a de cantora e a de cientista, então sigo cantando e tocando violão, ukulele, teclado, piano e flauta doce. Exercendo com amor a arte que aprendi com o meu pai. Mas quem sabe daqui uns anos não vemos uma mulher pilotando foguetes ao mesmo tempo em que faz shows do espaço? Sei que posso chegar lá!
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