Curiosas por natureza, e em contato com a diversidade, as crianças, por volta dos três anos, começam a querer saber a origem de tudo e os porquês, incluindo as questões de cunho sexual.
Além da auto-exploração corporal, que se intensifica nesta fase da vida, é comum as crianças repetirem nas brincadeiras comportamentos adultos e experimentarem a troca de papeis.
Como na brincadeira, a fantasia não encontra limites, a representação dos universos masculino e feminino aparece sem obstáculos: dois meninos ou duas meninas podem se beijar e se acariciar; querem ser a mulher/homem na relação, independentemente de seu sexo, e, muitas vezes, desejam se vestir e “ser” como o sexo oposto.
Desde que não estejam vulneráveis e expostas a fatores agressivos, como a coação, as brincadeiras e manifestações sexuais infantis têm caráter exploratório e não revelam a orientação sexual da criança.
O que está em jogo para as crianças é a curiosidade e a busca pelo entendimento sobre as diferenças que as pessoas e o mundo lhes apresentam.
No entanto, sabemos que muitas crianças estão apresentando brincadeiras e comportamentos que fogem do aspecto puramente exploratório esperado em cada faixa etária.
É preciso ficar atento à exposição precoce a conteúdos sexuais adultos e também à vulnerabilidade sexual infantil, que colocam as crianças diante de experiências que desrespeitam sua imaturidade biológica e psíquica.
Se a curiosidade e a exploração fazem parte do desenvolvimento saudável das crianças, por que alguns pais se incomodam quando se deparam com tais vivências de seus filhos e com a possibilidade de escolha sexual destes? Consideremos alguns aspectos relevantes.
A diversidade – e portanto as diferenças – aciona nossos pré-conceitos pessoais e sociais, acendendo nosso olhar pejorativo e discriminatório.
Em busca de um dito padrão de “normalidade”, e quase sempre incomodados com os julgamentos e retaliações que eles próprios e seus filhos possam vir a sofrer, pais se angustiam com o fato de seus filhos poderem ser “diferentes” daquilo que imaginaram ou do que seu ambiente espera.
É comum pais, na ânsia de formar seus filhos de acordo com seus princípios e valores, esquecerem de colocar seus ideais e expectativas em uma posição que permitam seus filhos construírem sua própria identidade, descoladas das deles.
Revela-se, assim, fortemente o desejo dos pais em relação à orientação sexual e aos papéis sociais que serão desempenhados pelos seus filhos no futuro.
Diante da possibilidade de algo “dar errado” ou “sair fora daquilo que esperavam e desejavam”, instala-se no adulto o medo e culpa, além de frustração e, em alguns casos, rejeição e sentimento de fracasso.
Neste sentido, é preciso que os desejos dos pais em relação aos desejos dos filhos sejam separados e entendidos individualmente para que a criança não seja sufocada em suas possibilidades e escolhas, seja ela qual for.
Falta de informação, vergonha, culpa e outros sentimentos impedem muitos adultos de tratarem a sexualidade das crianças como algo natural.
Na tentativa de querer “corrigir” comportamentos infantis (em vez de compreendê-los) criam conceitos e regras que impedem a criança de experimentar e descobrir coisas e conceitos sobre a vida e tudo que ela lhe mostra de diferente.
Ou ainda, criam rótulos com os quais a criança às vezes tem que carregar por toda vida, sem compreender qual o seu sentido.
Uma coisa sabemos e podemos compartilhar: a definição sexual de um indivíduo se dá pela interação entre fatores biológicos e ambientais bastante diversos e complexos.
Por isso, podemos dar como certo que as brincadeiras – sozinhas – não definem a orientação de sexual de um indivíduo.
Antes de induzir qualquer significado em determinados comportamentos infantis é preciso entender que através do livre brincar, crianças experimentam, aprendem e matam a curiosidade sobre vários aspectos existentes no mundo que a cerca.
(Texto escrito pela psicóloga Veronica Esteves de Carvalho), que tem 18 anos de experiência em psicoterapia para crianças, adultos e orientação a pais.
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