O aumento da taxa de desmatamento da Amazônia a partir de 2014 acendeu o sinal amarelo no governo federal, que convocou nesta quarta-feira e quinta representantes da academia, de governos estaduais e da sociedade civil para discutir formas de combater a perda da floresta, a fim de cumprir a meta de zerar o desmatamento ilegal até 2030.
Na semana passada, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou uma atualização para cima da taxa de desmatamento observada entre agosto de 2014 e julho de 2015. Dados preliminares do Prodes, o sistema de monitoramento por satélite do Inpe que apresenta a taxa oficial do desmatamento do ano, anunciados em novembro do ano passado apontavam que haviam sido perdidos 5.831 km² de floresta, o que já seria uma alta de 16% em relação a agosto de 2013 e julho de 2014. O aperfeiçoamento da análise mostrou que o corte raso atingiu 6.207 km². O aumento real foi de 24%.
Este é o maior valor desde 2011 e mostra uma tendência de alta perigosa. A partir de 2008, o desmatamento da Amazônia apresentou quedas sucessivas, chegando ao menor valor em 2012 - 4.571 km². De lá para cá, ocorreram algumas altas e baixas, mas a taxa ficou em torno de 5.000 km². É a primeira vez que volta a passar a barreira dos 6 mil. E a expectativa é que a tendência de alta continue."Estou preparada para isso", disse ao Estado Thelma Krug, diretora do Departamento de Políticas para o Combate ao Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente, sobre a nova taxa do Prodes deste ano.
O anúncio preliminar do período de agosto do ano passado a julho deste ano deve sair em novembro, mas dados de outro sistema do Inpe, o Deter, que observa a Amazônia em tempo real, dão sinais de que o crescimento deve ter se mantido. O Deter lança alertas que orientam a fiscalização e neste ano eles compreenderam uma área 16% maior que no ano anterior.
Grandes áreas
Ao apresentar esses dados no seminário de ontem em Brasília, o Inpe apontou que voltaram a ocorrer grandes polígonos de desmatamento, que tinham ficado mais raros nos últimos anos. Com o avanço dos mecanismos de comando e controle desde 2008, a derrubada de grandes porções de floresta foi diminuindo, porque é muito mais fácil de ser detectada por satélite e pela fiscalização. Os cortes passaram a ocorrer em menores áreas, o que era uma explicação para a dificuldade de reduzir ainda mais a taxa total.
No consolidado de 2014, 69% dos desmatamentos tinham ocorrido em propriedades de até 50 hectares. Em 2015, essa faixa passou a representar 59% dos cortes. Já áreas entre 100 e 500 hectares, que em 2014 tinham sido responsáveis por 15% do desmatamento, em 2015 abocanharam 20%.
Thelma, que está coordenando a nova fase do plano de combate ao desmatamento (PPCDAM), reconhece que têm ocorrido problemas na fiscalização desde 2014. Cortes no orçamento atingiram o Ibama e ela acredita que houve uma "percepção de falta da presença do Estado na Amazônia", mas diz que houve uma sinalização do governo Temer de que vai voltar a apoiar a fiscalização e o controle.
Segundo ela, a nova fase do PPCDAM vai trazer um novo eixo de atuação: instrumentos econômicos para incentivar o produtor a não desmatar. E um esforço de fiscalização mais concentrado nas áreas que mais têm sofrido com o desmatamento: florestas públicas que não têm destinação, terras privadas e assentamentos rurais.
Encruzilhada
Paulo Moutinho, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), um dos representantes da sociedade civil no seminário, afirmou que se a alta se confirmar, o País estará diante de uma encruzilhada.
"Ou toma ações definitivas para acabar de uma vez com o desmatamento, criando alternativas inclusive para o corte legal, como novas formas de rendimento, ou vamos ver essa retomada da perda da Amazônia com um agravante que não tínhamos antes", disse.
Ele se referiu ao aquecimento global. "Desmatamento e mudança do clima combinados trazem seca e causam um processo extra de degradação que pode mudar mais rápido o clima na região, afetando até mesmo a principal fonte de PIB do Brasil, que é o agronegócio", explicou.
O Ipam ofereceu um conjunto de seis ações que poderiam ajudar a zerar o desmatamento: criar salvaguardas mais criteriosas para obras de infraestrutura na região; implementar o Código Florestal; agir nos assentamentos; implementação do PPCDAM; agir nas florestas públicas não destinadas e criar sistemas financeiros inovadores para a conservação da floresta.
Sobre os assentamentos, destacou que hoje cerca de 30% do desmatamento ocorre neles. "Está concentrado em uma parcela deles e ocorre tanto pelas mãos do assentado quando por terceiros. É preciso criar uma política de reforma agrária, com assistência técnica e mecanismos inovadores para que eles consigam viver da terra e não migrem para o que chamamos de 'agronegocinho'", disse Moutinho.
Assim como Thelma, ele lembrou o papel das áreas sem destinação. "Temos mais de 70 milhões de hectares na Amazônia nessa situação. É quase a mesma área total que foi desmatada ao longo dos anos na Amazônia. Elas são objeto de grilagem. Destiná-las para um uso sustentável ou transformá-las em unidades de conservação é o modo mais rápido de frear o avanço sobre essas áreas", defendeu.
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