Região sul-fronteira é a mais atingida; perdas poderão significar prejuízo bilionário na safra.

Chuva escassa pode levar MS a perder 47 milhões de sacas de soja
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Em Mato Grosso do Sul, um total de 949 mil hectares plantados com soja estão classificados como em condições ruins pelo Sistema de Informações Geográficas do Agronegócio (Siga MS), indicando que as perdas na colheita da oleaginosa são dadas como certas, em diferentes níveis. 

Considerando a estimativa da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso do Sul (Aprosoja-MS) de produtividade de 51,7 sacas por hectare, isso significa que o Estado poderá ter uma perda de até 49,06 milhões de sacas. Na cotação atual (R$ 115,00 a saca de 60 kg), o prejuízo poderia alcançar R$ 5,64 bilhões.

Como comparação quantitativa, na safra 2023/2024, Mato Grosso do Sul produziu 188 milhões de sacas de soja, o equivalente a 11,2 milhões de toneladas.

ESTIAGEM
A causa da perda de produtividade é atribuída ao longo período de estiagem, foram 40 dias sem chuva, que afetou lavouras semeadas de setembro até meados de outubro de 2024, principalmente nas regiões sul e sul-fronteira. 


Gráfico anexado ao Boletim Casa Rural, elaborado pela Famasul, o governo do Estado e a Aprosoja-MS, com informações do Siga MS, mostram, porém, que os 949,1 mil hectares de lavouras em condições ruins se espalham por todas as oito regiões agrícolas do Estado, sem exceção. Isso representava, até terça-feira, 21,1% da área plantada com o grão, de 4,501 milhões de hectares.

Sem contar outros 973 mil hectares de soja que se encontram em condição considerada regular e também reservam perdas. 

Segundo o boletim do Siga MS, para uma lavoura ser classificada como ruim, ela deve apresentar diversos critérios negativos, tais como alta infestação de pragas (plantas daninhas, pragas e doenças), falhas no estande de plantas, desfolhamento excessivo, enrolamento de folhas, amarelamento precoce das plantas, entre outros defeitos que causem perdas significativas de produtividade.

No ciclo anterior (safra 2023/2024), o Estado registrou 899,8 mil hectares de lavouras em condições ruins no dia 10 de maio, quando encerrou a colheita da soja. Bem diferente do atual ciclo, em que 17,3% das lavouras já foram colhidas e quase 950 mil hectares estão condição ruim.

Na média geral das condições das lavouras, Mato Grosso do Sul só tem 57,3% das lavouras classificadas como boas. 

AMAMBAI PERDE MAIS
No município de Amambai, região sul-fronteira, severamente afetado pela falta de chuvas, as perdas na lavoura são confirmadas pelo agricultor Cristiano Bortolotto, ex-presidente da Aprosoja-MS.

Em entrevista por telefone à reportagem do Correio do Estado, ele relata que há vários anos a região vem sofrendo com a estiagem. Segundo ele, depois da chuva do dia 12 de dezembro, só choveu no município no dia 18 de janeiro deste ano.

“Considerando que a soja tem um ciclo de 115 dias e precisa de 13 mm de água por dia, não há como a lavoura resistir a um clima de estiagem semelhante ao semiárido”.

Segundo Bortolotto, que plantou 3,5 mil hectares na safra 2024/2025, a produtividade da lavoura no município deverá variar de 10 sacas a 25 sacas por hectare até 45 sacas por hectare.

“Há áreas em que nem compensa colocar a colheitadeira no campo”, avalia.

“Há talhões em que a produtividade é muito ruim e a perda chega a 60%”, calcula. 

No atual ciclo da soja, os agricultores enfrentam outros dois problemas graves: o custo de produção alto e o preço baixo do grão.

Amambai vive da produção agropecuária. Nas contas de Cristiano Bortolotto, considerando que a produtividade da soja nesta safra no município fique entre 28 sacas e 30 sacas por hectare, o prejuízo será de R$ 370 milhões, fora perdas de faturamento com frete, mão de obra, prestação de serviços, entre outros.

O município plantou 144,5 mil hectares de soja nesta safra – é a maior área plantada na região sul-fronteira.
A perda de potencial é confirmada pelo presidente do Sindicato Rural de Amambai, Douglas Júnior. Segundo ele, as primeiras colheitas indicam uma produtividade entre 10 sacas e 40 sacas por hectare.

“A média final deve ficar entre 30 e 35 sacas. A queda deve ser algo em torno de 54% e afeta a região sul-fronteira toda e parte da região sul”, ressalta, calculando que o município de 36 mil habitantes deverá sofrer com perdas de R$ 500 milhões em toda a sua cadeia produtiva. 

A região sul-fronteira do Estado inclui Aral Moreira, Amambai, Coronel Sapucaia, Tacuru, Paranhos e Sete Quedas e é responsável pelo plantio de quase 400 mil hectares de soja.

PREJUÍZO
O agricultor Diogo Peixoto da Luz, também de Amambai, que plantou 916 hectares com a oleaginosa, inclui o município de Iguatemi, na região sudeste, entre os que tiveram perdas significativas na produtividade de soja. Iguatemi teve 55% das lavouras classificadas como ruins no boletim do Siga MS do dia 11.

“O que é classificado como ruim dificilmente é recuperado”, avalia.

Segundo ele, a soja que é tida como ruim já fechou o ciclo de produção, e o que sobrou de vagem teve má formação de grão, com peso baixo.

“É um prejuízo consolidado”, explica. 

Além da falta de chuvas, ele cita também as altas temperaturas que afetaram a região como uma das causas da perda de potencial produtivo das lavouras. O resultado das primeiras colheitas na região foi de 15 sacas a 40 sacas por hectare.

“A quebra na primeira fase de colheita é de 40%”.

A grande concentração do plantio em Amambai ocorreu entre 1º e 15 de outubro, mais de 50% da área do município, mas a média, segundo o agricultor, também não é boa, devendo ficar entre 35 sacas e 40 sacas por hectare.

Com safras frustradas, acontece a piora no endividamento do produtor.

“O que vimos pelo Estado e pelo Brasil todo é o aumento de recuperação judicial, produtores não conseguindo honrar seus compromissos, com pedido de prorrogação de investimentos, de custeios, produtores rurais com dificuldades para pagamento das máquinas. Temos assistido a bancos e concessionárias fazendo arresto de bens de agricultores”, relata. 

Outra consequência do endividamento citada por ele é que nas próximas safras o pacote tecnológico implementado será menor, com menos adubo e aplicação de produtos agroquímicos de baixa qualidade, o que reduz o custo de produção, mas acaba colocando em risco a produtividade futura.

PREVISÃO MANTIDA
Para a Aprosoja-MS, no dia 31 de janeiro, em torno de 42% das lavouras haviam sido afetadas pela estiagem, em condições ruim e regular, no entanto, algumas áreas poderiam recuperar parte do potencial produtivo. 

“No momento [em 4 de fevereiro] estamos com apenas 11% das áreas colhidas, ainda é cedo para estimar o impacto da estiagem nessa safra”, afirma o engenheiro-agrônomo da entidade, Flávio Faedo Aguena.

A Aprosoja-MS, segundo Aguena, faz o levantamento de produtividade quando 10% das áreas forem amostradas, atualizando a estimativa de produção para esta safra. 

O último boletim, desta terça-feira, já contabilizava a colheita de 17,7% da área de soja, algo em torno de 778,6 mil hectares.

O agrônomo afirma que a estimativa de 51,7 sacas por hectare já leva em consideração os desafios climáticos. Para ele, o maior vilão das últimas safras foi o clima, a falta de chuva e as temperaturas altas, que prejudicaram bastante o potencial produtivo das lavouras de soja.

“As pragas, doenças e plantas daninhas os produtores estão conseguindo controlar”, avalia.

Como parâmetro de comparação, na safra 2023/2024, que viveu situação semelhante à do ciclo atual, com agricultores enfrentando falta de chuvas e temperaturas altas, a produtividade inicialmente projetada pela Aprosoja-MS era de 54 sacas por hectare.

Após uma revisão em abril de 2024, a produtividade foi reajustada para 50,5 sacas por hectare, uma redução de 9,6% em relação à projeção inicial. A produtividade final de 48,84 sacas por hectare foi considerada a terceira pior dos últimos 10 anos em Mato Grosso do Sul.

Na safra 2023/2024, Mato Grosso do Sul expandiu sua área plantada com soja para 4,2 milhões de hectares, aumento de 5,2% em comparação ao ciclo anterior. No entanto, a produção final foi de 12,3 milhões de toneladas, uma retração de 17,7%.