Com a decisão do governo de Mato Grosso do Sul de paralisar totalmente a obra do Aquário do Pantanal, os peixes que deveriam ir para os tanques da estrutura e que estavam de quarentena em galpões instalados no quartel da Polícia Militar Ambiental (PMA), em Campo Grande, vão ser utilizados também para pesquisas científicas.
A informação foi revelada ao G1, na manhã desta terça-feira (17), pelo diretor de Licenciamento do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), Ricardo Eboli. Desde 30 de junho de 2015, o órgão assumiu a gestão da quarentena dos peixes.
Conforme Eboli, cerca de 7 mil peixes, de 180 espécies diferentes entre nativas de Mato Grosso do Sul e exóticas de outros estados e países, estão sendo mantidos em tanques provisórios nos galpões.
O custo para a manutenção destes animais, somando as despesas com funcionários, alimentação e a própria conservação da estrutura, varia entre R$ 40 mil e R$ 50 mil por mês, de acordo com o diretor do Imasul.
Pouco antes do Imasul assumir a gestão da quarentena, a empresa que era responsável pelo trabalho apontava que, dos 13 mil peixes que estavam no local, cerca de 6 mil tinham morrido, uma das causas apontadas na época era um choque térmico. Para evitar que a situação se repita, o órgão estadual instalou bombas de calor, que visam manter a temperatura estável nos tanques.
Entre os estudos que serão realizados com os peixes, Eboli cita a coleta de material para a criação de um banco de sêmen de espécies nativas do estado, além de estudos sobre a genética e a reprodução destes animais.
“Precisamos ter responsabilidade com os recursos públicos. Com essa indefinição quanto a conclusão da obra, precisamos aproveitar que esses animais já estão aclimatados e com bom controle sanitário para gerar algum benefício para o estado, por isso, a decisão de canalizar as ações para a pesquisa neste momento”, diz o diretor, completando que isso não impede que os exemplares sejam imediatamente transferidos para o Aquário do Pantanal quando a obra for concluída.
O aquário
O nome oficial do Aquário do Pantanal é Centro de Pesquisa e Reabilitação da Ictiofauna Pantaneira. O empreendimento foi lançado em 2011 pelo então governador André Puccinelli. As obras começaram no mesmo ano e quando finalizado a previsão é de que deveria ser o maior aquário de água doce do mundo, com 6,6 milhões de litros de água, distribuídos em 24 tanques, com 7 mil animais de 263 espécies, entre elas, peixes, jacarés e cobras. A estrutura deveria contar ainda com uma unidade de pesquisa, com 1.000 metros quadrados de laboratório e biblioteca digital.
Inicialmente a obra deveria custar entre R$ 84 milhões e R$ 87 milhões e deveria ser entregue em outubro de 2013, mas o prazo de conclusão foi sendo adiado e com ele, o custo do empreendimento foi aumentando. A entrega passou para outubro de 2014, depois para dezembro do mesmo ano e com a paralisação das obras na segunda-feira passada, mesmo com 95% da estrutura concluída, deve ser entregue somente em 2016.
O custo aumentou neste intervalo de tempo 138,09%. Segundo o secretário estadual de Infraestrutura de Mato Grosso do Sul, Ednei Marcelo Miglioli, já foram investidos na obra R$ 200 milhões e como ainda falta 5% da obra para ser concluída, o que inclui a parte do acabamento e de alguns serviços, esse valor deve aumentar ainda. A projeção é de que o valor total atinja os R$ 230 milhões.
O secretário reiterou que a obra foi paralisada pelo governo do estado porque a construtora que venceu a licitação para construir o aquário, a Egelte, conseguiu uma liminar na Justiça que a desobrigou de voltar ao canteiro. Ele disse que como as outras empresas que executavam serviços no local dependiam dos trabalhos da empreiteira, elas não tiveram condições de terminar seus contratos, por isso, para que não se continuasse tendo despesas com uma obra que já estava praticamente parada, os outros contratos foram paralisados.
Miglioli diz que agora o governo do estado entrou com um recurso na Justiça para tentar derrubar a liminar da Egelte, para obrigar a empresa a retomar ao canteiro. Caso consiga e a empresa não volte a executar a obra, o contrato será rescindido unilateralmente e uma nova licitação será aberta para a conclusão do aquário.
A Egelte, por meio de uma nota de esclarecimento, apontou que a decisão judicial apenas reguardou o seu direito de não reassumir a obra até que fosse realizada uma completa auditoria no local, já que estava afastada dos canteiros dos empreendimento desde março de 2014, quando, afirma, que foi substituída no trabalho, por imposição da gestão anterior da Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos (Agesul), por outra construtora, a Proteco.
No texto, a Egelte ressalta ainda que a auditoria é necessária não somente para apurar as atuais condições técnicas da obra, mas também a fase em que se encontra, e sobretudo, os custos para a sua conclusão e que a decisão judicial em nenhum momento obrigou a atual gestão da Agesul a suspender totalmente a obra e a execução dos outros contratos para a conclusão do Aquário do Pantanal.
Obra sob suspeita
Em julho, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao governo do estado uma auditoria em contratos e obras da Proteco. Com isso, os trabalhos e o pagamento dos contratos deveriam ficar suspensos até o fim da fiscalização. Na época, o Executivo informou que ia acatar a recomendação, que foi baseada na operação Lama Asfáltica, da Polícia Federal, que investiga fraude em licitações e desvio de recursos públicos.
Uma força tarefa que reúne instituições como o próprio MPF, a Controladoria Geral da União (CGU) e o Ministério Público Estadual (MPE) está investigando a obra do Aquário do Pantanal. Estão sendo apuradas todas as etapas, desde o seu início até a fase atual, e ainda a legalidade e os passos da execução. Como o trabalho ainda está em curso, os órgãos envolvidos ainda não podem se pronunciar sobre as investigações. A CGU, entretanto, aponta a expectativa de concluir a apuração até o fim do ano, mas o prazo pode se estender. Somente do órgão federal, três auditores foram mobilizados para trabalhar neste caso.
Outra instituição que tem acompanhado de perto a obra é o Tribunal de Contas do Estado (TCE). A corte tem monitorado a evolução passo a passo do maior aquário de água doce do mundo e divulgado as medições em seu portal da transparência. Para acessar clique aqui . Conforme o tribunal, este tipo de procedimento é padrão na execução de obras públicas e somente após a conclusão da estrutura é que será emitido um parecer sobre a regularidade ou não do empreendimento.
Necessidade do aquário
A destinação de um volume tão grande de recursos a construção do aquário, um empreendimento voltado principalmente a pesquisa científica e ao turismo, utilizando dinheiro público que poderia ser destinado a serviços essenciais, como saúde, educação e segurança pública, provoca críticas da própria população e de vários segmentos da sociedade.
Um dos que criticam o empreendimento é o presidente da mesa diretora do Conselho Estadual de Saúde, Ricardo Alexandre Corrêa Bueno. “Já na gestão anterior, quando se anunciava a previsão de gastar R$ 84 milhões na construção do aquário, acreditava que era um investimento absurdo em um empreendimento que é mais voltado para o turismo e para a pesquisa científica, quando a prioridade tem que ser sempre a saúde e a educação”, comenta.
Ele diz que esse investimento, na época do lançamento da obra, seria suficiente para construir, por exemplo, em Campo Grande, um hospital que funcionasse em parceria com o município e que poderia desafogar a Santa Casa e o Hospital Regional. “Agora imagina no interior, onde as obras chegaram a ser lançadas mas não passaram disso, como em Dourados, Três Lagoas e Corumbá, que precisam com urgência desse reforço”.
Para o presidente do Conselho Estadual de Saúde, a previsão de investimento total na obra do aquário passar dos R$ 200 milhões, se torna ainda mais absurda quando esse valor é comparado, por exemplo, com o investimento que a Caixa de Assistência dos Servidores do Estado (Cassems) está fazendo na construção de um hospital de 107 leitos em Campo Grande, que é em torno dos R$ 60 milhões.
“Enquanto o governo já sinaliza que deve ter dificuldades em cumprir o investimento obrigatório de 12% na saúde, enquanto é necessário melhorar a infraestrutura da saúde em todo o interior e na capital, fazer um investimento desse é absurdo”, afirmou.
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